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Milhares de estudantes voltam às ruas na Venezuela (Foto: Christian Veron/Reuters) |
Recebi aqui de um leitor
um arrazoado bastante capenga, afirmando que uso “dois pesos e duas medidas”
para avaliar os protestos na Venezuela e no Brasil. Eu seria favorável às
manifestações lá e contrário aqui. Pra começo de conversa, peço um favor: vamos
usar a expressão com correção. O certo para indicar o que o rapaz tentou dizer
é “um peso e duas medidas” — porque desequilibraria a balança, entenderam? Quem
diz que o outro usa “dois pesos e duas medidas” só o está acusando de ter sido
justo… Não sei se me fiz entender. Mas sigamos.
A Venezuela, técnica e
praticamente, é uma ditadura, e o Brasil, felizmente, é uma democracia plena.
Ainda é, e vamos lutar para que continue assim. Neste domingo, milhares de
estudantes voltaram às ruas de Caracas para protestar contra o governo e contra
encapuzados que têm se infiltrado nas manifestações — aquelas, sim, pacíficas —
para promover a violência e o caos. Uma nova convocação foi feita para esta
segunda.
Na semana passada, três
pessoas morreram a tiros em manifestações de rua, dezenas ficaram feridas, e há
nada menos de 200 presos — três deles são jornalistas. Os tumultos foram
promovidos, já está mais do que claro, por milícias chavistas armadas, que se
infiltraram entre os que protestavam para promover o quebra-quebra e a
depredação. Isso forneceu ao ditador Nicolás Maduro o pretexto para uma onda
repressiva sem precedentes, com ordem para prender políticos de oposição. Um
deles, Leopoldo López, está foragido, e a polícia o caça país afora. Maduro o
acusa, acreditem, de terrorismo e de tramar um golpe no país. É um lunático.
Neste domingo, anunciou a expulsão de três diplomatas americanos, que, segundo
ele, estariam envolvidos em conspiração. É o velho truque dos malandros
latino-americanos: quanto tudo vai mal, basta culpar os EUA.
Maduro é ditador mesmo
tendo sido eleito? É. Para começo de conversa, foram eleições sujas, feitas sob
a ação terroristoide das milícias e sem que a oposição tivesse acesso à
televisão — hoje um monopólio estatal. As TVs oficiais, diga-se, se negaram a transmitir
os protestos. Nota à margem: o marqueteiro que fez a campanha de Maduro é João
Santana, o mesmo que cuidou da reeleição de Lula, da primeira campanha de Dilma
e que vai agora se encarregar da segunda.
O presidente da Venezuela
tem traços claros de psicopatia. Diz conversar com passarinhos, que lhe
transmitiriam mensagens de Hugo Chávez, e vê a imagem do ditador morto em
rebocos de parede. Seria só um bufão folclórico se não estivesse conduzindo a
nação para o caos. A Venezuela é hoje um dos países mais violentos do mundo. Em
Caracas, há mais de 100 homicídios por 100 mil habitantes. No Brasil, com toda
a escandalosa violência, são 26 — em São Paulo, 10,5. Isso dá conta do que vai
pelas ruas da capital venezuelana.
A economia está destruída:
de comida a papel higiênico, falta tudo nas prateleiras dos supermercados —
inclusive daqueles estatais, criados pelo modelo chavista para supostamente
garantir o abastecimento. A inflação no país é a mais alta da América Latina:
se a nossa foi de 5,91% em 2013, a venezuelana foi de 56,2% — 8 vezes e meia a
mais.
Os estudantes que vão às
ruas na Venezuela se insurgem contra um país em que a liberdade de expressão é
limitada, o Judiciário e o Parlamento estão submetidos às gangues chavistas, o
tal “Socialismo do Século XXI” condena a população à miséria e ao atraso, e
líderes da oposição estão sendo encarcerados. Mesmo o jornalismo impresso, mais
independente, sofre terríveis pressões porque o governo ameaça cortar a cota de
papel.
Assim, comparar os
protestos que ocorrem lá com os que ocorrem aqui, como querem fazer alguns, é
uma tremenda bobagem. Os critérios com que se avaliam as lutas contra uma
ditadura não podem servir de baliza para manifestações de descontentamento num
regime democrático. De resto, os estudantes venezuelanos promovem protestos
realmente pacíficos e saíram às ruas neste domingo justamente para repudiar a
violência, obra de delinquentes a serviço do governo.
Um lamento adicional é
saber que, desrespeitando o protocolo do Mercosul — que não aceita governos
ditatoriais —, Dilma Rousseff e Cristina Kirchner, presidente da Argentina,
promoveram a entrada da Venezuela no bloco. O Brasil decidiu ser sócio de um
governo que censura a imprensa, prende opositores e mata seu próprio povo.
Por Reinaldo Azevedo
Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/os-que-estao-nas-ruas-na-venezuela-querem-e-democracia-os-black-blocs-no-brasil-sao-e-bandidos/
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