ACÓRDÃO - TRT 17ª Região -
00301.2009.001.17.00.3
0030100-24.2009.5.17.0001
RECURSO ORDINÁRIO
Recorrente:
Sindicato dos Servidores
Policiais Civis - SINDIPOL
Recorrido:
SINPOL - Sindicato dos
Investigadores de Polícia Civil do Estado do Espírito Santo
Origem:
1.ª VARA DO TRABALHO DE VITÓRIA -
ES
Relator:
DESEMBARGADOR JOSÉ LUIZ SERAFINI
EMENTA
PRINCÍPIO DA UNIDADE SINDICAL.
CATEGORIA ECLÉTICA. DESMEMBRAMENTO. REGISTRO NA AUTORIDADE COMPETENTE. O
Princípio da Unicidade Sindical, previsto no inciso II, do art. 8º da
Constituição Federal de 1988, determina que apenas um sindicato poderá
representar cada categoria profissional ou econômica, em uma determinada base
territorial. Entretanto, pode ocorrer o desmembramento, mormente nas categorias
ecléticas, devendo o ato ser registrado no MTE para a perfeita criação do
sindicato.
Vistos, relatados e discutidos os
presentes autos de RECURSO ORDINÁRIO, sendo partes as acima citadas.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso ordinário
interposto pelo sindicato reclamante em face da r. sentença de fls. 971-976,
oriunda da 1ª Vara do Trabalho de Vitória/ES, da lavra da eminente magistrada
Lucy Lago, que julgou improcedentes os pleitos contidos na reclamação trabalhista.
Razões recursais do sindicato
reclamante às fls. 979-986.
Comprovantes do recolhimento das
custas e do depósito recursal às fls. 987-988.
Contrarrazões do sindicato
reclamado às fls. 994-1016.
Desnecessária a remessa dos autos
ao Ministério Público do Trabalho, a teor do artigo 24-A do Regimento Interno
deste Tribunal.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
2.1 CONHECIMENTO
Conheço do recurso ordinário
interposto, porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade.
2.2 MÉRITO
2.2.1 DA UNICIDADE SINDICAL
O sindicato reclamante (SINDIPOL)
aduz que o réu não conquistou seu registro junto ao Ministério do Trabalho e
Emprego, e por esta razão estaria representando a categoria dos investigadores
da Polícia Civil do Estado do Espírito Santo de forma ilegal, porquanto viola o
princípio da unicidade sindical.
Isto porque entende que a
representação dos servidores da categoria policial civil do Estado do Espírito
Santo é realizada legalmente pelo reclamante, sendo que o desiderato
segregacionista do reclamado (SINPOL) implica em afronta ao disposto no artigo
8º, II, da CF, dispositivo consubstanciador do princípio acima referido.
Neste aspecto, requer a
declaração da inexistência legal do reclamado, cancelando o registro perante o
Ministério do Trabalho e Emprego, acaso exista. Aduz que o reclamado possui
registro de pessoa jurídica, o que demonstra que a sua criação não ocorreu de
maneira lícita e correta.
Em sua fundamentação, o
reclamante (SINDIPOL) cita decisão da Justiça Comum Estadual, situação em que
litigava contra o SINDELPO (Sindicato dos Delegados de Polícia - ES),
decidindo-se que os delegados de polícia são servidores policiais civis, sendo
vedado a outro sindicato diverso do reclamante representar essa carreira na
base territorial do Estado do Espírito Santo.
Em contrarrazões, argumenta o
reclamado que o SINPOL é sindicato específico da categoria dos investigadores
de polícia civil do Estado, carreira distinta das demais, inclusive em sua
forma de ingresso e promoção.
Argumenta que o reclamante
possuía plena ciência dos atos tendentes à dissociação da categoria dos
investigadores de Polícia (e.g. assembléia geral, notificação ao cartório),
porquanto procurou dar a maior amplitude, buscando o debate, a divulgação e a participação
dos interessados. Este iter procedimental foi tomado em obediência aos
preceitos insculpidos na CLT, mormente os artigos 515 e seguintes.
Por fim, alega que estando
demonstrada a não representatividade do sindicato reclamante, não merece ser
provido o seu recurso, devendo permanecer intacta a decisão de piso.
O juízo de piso indeferiu o
pleito fundamentando-se na impossibilidade de proferir ato judicial acerca de
situação futura não consolidada. Esta situação se explica pelo fato do
sindicato réu ainda não ter representação sindical da categoria, porque ainda
não conseguiu o registro sindical, condição necessária para que represente os
integrantes da categoria profissional.
Pois bem.
O Princípio da Unicidade
Sindical, previsto no inciso II, do art. 8º da Constituição Federal de 1988,
determina que apenas um sindicato poderá representar cada categoria
profissional ou econômica, em uma determinada base territorial. Entretanto,
pode ocorrer o desmembramento, nas situações de categorias ecléticas, havendo a
criação de outro sindicato representativo de categoria específica, sendo que
tal redução pode se dar a partir de ato de vontade dos próprios integrantes da
categoria que se dissociem para constituírem sindicato filho com representação
mais delimitada, desde que respeitado o disposto no inciso II, art. 8º da
CF/88.
O requerente transcreve acórdão
proveniente da Justiça Comum, ocasião em que foi decidido que os delegados de
polícia, peritos criminais, papiloscopistas, médicos legistas e investigadores
compõe carreira integrante do quadro de servidores Policiais Civis do Estado do
Espírito Santo, sendo vedado a outro sindicato a representação desta categoria.
Comungo de entendimento distinto, no sentido de que havendo categoria
específica, é possível a criação de outro sindicato representativo.
Neste sentido, o douto Procurador
do Trabalho se manifestou nos autos (fls. 942-943), admitindo que em tese “é
possível o desmembramento ou cisão de uma organização sindical eclética, em
outra, por vontade da categoria profissional específica – no presente caso os
investigadores de polícia – deliberada em assembléia autônoma, sem
interferência do Poder Público e de interesses políticos ou econômicos.”.
Nos termos do artigo 518 da CLT,
disposição regedora do registro sindical, “o pedido de reconhecimento será
dirigido ao Ministro do Trabalho instruído com exemplar ou cópia autenticada
dos estatutos da associação”. O termo “reconhecimento” guarda resquícios do
sistema autoritário regedor dos sindicatos, mas hodiernamente equivale ao
registro no órgão competente, previsto no texto constitucional.
Entretanto, a necessidade de se
submeter ao Poder Executivo o registro para que o sindicato exerça suas
atividades legais, embora possa remontar a intromissão indevida da seara
pública nas organizações tendentes à defesa dos interesses econômicos e sociais
dos associados, foi chancelada pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvando que a
lei pode vir a criar regime diverso. Merece ser transcrita a decisão, ipsis
litteris:
“Liberdade e unicidade sindical e
competência para o registro de entidades sindicais (CF, art. 8º, I e II):
recepção em termos, da competência do Ministério do Trabalho, sem prejuízo da
possibilidade de a lei vir a criar regime diverso. O que é inerente à nova
concepção constitucional positiva de liberdade sindical é, não a inexistência
de registro público – o qual é reclamado, no sistema brasileiro, para o
aperfeiçoamento da constituição de toda e qualquer pessoa jurídica de direito
privado –, mas, a teor do art. 8º, I, do Texto Fundamental, ‘que a lei não
poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato’: o decisivo,
para que se resguardem as liberdades constitucionais de associação civil ou de
associação sindical, é, pois, que se trate efetivamente de simples registro –
ato vinculado, subordinado apenas à verificação de pressupostos legais –, e não
de autorização ou de reconhecimento discricionários. (...)” (MI 144, Rel. Min.
Sepúlveda Pertence, julgamento em 3-8-1992, Plenário, DJ de 28-5-1993).
Este órgão encarregado do
registro deverá “zelar para que não haja mais de uma organização sindical do
mesmo grau na mesma base territorial”, no momento em que for realizado o
procedimento. Este controle se coaduna com a previsão constitucional em todos
os seus aspectos, porquanto o órgão detentor do poder de verificação do
registro, é também competente para verificar a presença dos requisitos
pertinentes.
Haja vista que o processo
administrativo de registro deve obedecer às regras dispostas na Lei n.
9.784/99, deverá haver a obediência ao contraditório, instrução e decisão,
atentando-se para a legalidade da medida. Neste passo, “se a Constituição impõe
a unicidade sindical, e se a análise do pedido de registro em conjunto com a
impugnação revela que há ofensa ao princípio constitucional, não poderão as
partes envolvidas, com o aval da administração pública, dispor de outro modo.”.
Nesta análise, será averiguado se
existem outras entidades na mesma base territorial, conforme a Portaria n.
186/08 do MTE, in verbis:
Art. 4o Os pedidos de registro
sindical ou de alteração estatutária serão analisados na CGRS, que verificará
se os representados constituem categoria, nos termos da Lei, bem como a
existência, no CNES, de outras entidades sindicais representantes da mesma categoria,
na mesma base territorial da entidade requerente.
Após a verificação dos
requisitos, será aberto prazo para impugnações, que serão analisadas pela
própria CGRS, para ao final, após análise técnica da SRT, na forma do artigo 15
da Portaria mencionada, haver a publicação da concessão de registro sindical,
finalizando o procedimento e concedendo o registro à entidade sindical.
Denota-se que, apenas após
transcorrer todo o procedimento é que será existente a entidade sindical. O que
deseja o reclamante é a declaração do Judiciário acerca de uma situação ainda
não perfectibilizada.
Observe-se que, havendo violação
da unicidade sindical, o próprio MTE, de acordo com o disposto na Portaria
186/08, analisando as qualidades técnicas do pedido feito pela entidade
sindical, indeferirá o pleito que será arquivado pelo Secretário de Relações do
Trabalho, após análise da CGRS, nos termos do artigo 10º.
Arquivando-se o registro, será
possível que o sindicato irresignado pleiteie ao Judiciário a remoção do ilícito,
em decorrência da inafastabilidade da jurisdição. Ressalte-se que apenas após
constituída a situação de fato, haverá interesse do sindicato reclamante de
buscar a satisfação de seu desiderato perante esta Especializada.
No caso em tela, o reclamante
autor não faz prova da constituição do reclamado, ainda afirma que deverá ser
cancelada a sua inscrição, “acaso exista”, o que demonstra que a situação
fática não está estabelecida, inexistindo situação ilícita a ser declarada pelo
Judiciário.
É possível o desmembramento de
sindicato de categoria “eclética” ou “concentrada” para a formação de sindicato
específico, desde que feita através de ato volitivo da fração da categoria que
quer se desmembrar.
Analisando o caso concreto, a
relação de Investigadores de Polícia aponta que os servidores não estão sendo
representados de maneira uníssona, sendo que na maioria das vezes são
associados aos dois sindicatos (fls. 901-937), situação que não pode se
prolongar, em decorrência da unicidade sindical.
O Ministério Público do Trabalho,
oficiou “pela realização de assembléia deliberativa da categoria, sob
supervisão do juízo e do MPT (nomeando-se um perito de confiança do juízo), com
a participação exclusiva da classe dos Investigadores de Polícia, para que
decidam sobre a permanência ou desmembramento do SINDIPOL, facultando-se o voto
aos profissionais citados(...)” (fl.943).
Ocorre que esta assembléia não
gerou frutos, pois “as partes não chegaram a uma conclusão conjunta sobre a
viabilidade de convocação de assembléia envolvendo apenas os investigadores de
polícia a fim de deliberarem sobre a conveniência ou não do desmembramento da
categoria do Sindipol (...)”(fl. 969).
Os sindicatos devem chegar a um
consenso pela via administrativa, adotando o procedimento previsto no estatuto
próprio e na lei, aferindo-se a vontade de seus constituintes. Não há como se
declarar a inexistência do sindicato reclamado, uma vez que não foi
completamente constituído.
Por outro lado, a representação
dos sindicalizados pelo sindicato reclamado é legitima, mesmo diante da
precariedade de sua constituição. Isto decorre do grande número de servidores
associados a ambos os sindicatos (mais de 90% dos nomes relacionados aparecem
como filiados em ambos – fl. 863) além da existência de categoria eclética e
diferenciada.
Saliente-se que o sindicato
reclamado publicou edital de convocação de assembléia geral extraordinária no
diário oficial, para discutir o desmembramento e ratificar o ato de criação da
entidade (fl. 239), persistindo a discordância acerca do desmembramento. O
sindicato reclamante busca através de medidas judiciais obstar que o ato de
segregação ocorra, contrariando a legislação pertinente (fl. 78).
Isto porque, existindo categoria
eclética, é possível a criação de um sindicato que melhor represente a classe
dos investigadores, devendo ser trilhado caminho legal e administrativo, sem
que haja óbices a sua constituição.
Neste sentido, é possível que
haja legitimidade do sindicato reclamado para defender os Investigadores da Polícia
Civil, mesmo que envolto em situação precária. A representação deve perdurar
até que se resolva administrativamente em assembléia, ou até o registro
efetuado no MTE, ocasião em que o órgão estatal procederá à análise de
legalidade do ato. Colhe-se precedente bastante elucidativo, in verbis:
Este Juiz, pelo menos por
enquanto, se convenceu que o Sindicato tem legitimidade para representar a
categoria, apesar de admitir uma personalidade sindical precária, ante a falta
de registro atual no Ministério do Trabalho. (...) "Poderemos comparar a
questão da atuação do Sindicato na defesa da Categoria a uma atuação de
advogado sem procuração no processo trabalhista, mas que comparece as
audiências. (...). Com efeito, o questionamento sobre a ausência de cadastro no
Ministério do Trabalho no momento atual da vida do Sindicato não induz dizer de
sua falta de representatividade ou personalidade sindical. Pode-se admitir uma
irregularidade administrativa, no entanto, perfeitamente sanável, o que já está
sendo providenciada pelo Sindicato, conforme os documentos juntados ao processo
fazem crer. ( RR - 24700-82.2003.5.19.0001 , Relator Ministro: Roberto Pessoa,
Data de Julgamento: 02/06/2010, 2ª Turma, Data de Publicação: 18/06/2010).
Outro precedente, indicando a
possibilidade da representatividade sindical, mesmo havendo a falta de registro
no órgão competente. Observe-se que o precedente indica a representação ad
processum, em geral revestida de grande formalidade, que no caso foi afastada.
Neste sentido:
Apesar da mantença do princípio
da unicidade sindical (art. 8º, inciso II), a atual Carta Política veda ao
Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical e nega
qualquer exigência de autorização por parte do Estado para a fundação de ente
sindical. O registro no órgão competente é mera ressalva para assegurar
propósito diverso: o princípio da unicidade sindical. Seu conteúdo é meramente
administrativo, por isso regulado por meio de instruções normativas
ministeriais (em regra, MTE). O procedimento de registro, porque longo e, em
regra, desprovido do contraditório, não pode afetar a emergência e afirmação da
representatividade sindical, tão acalentada pela ordem constitucional. A
imprescindibilidade do registro para conferir legitimidade ad processum ao ente
sindical, como preconiza a Orientação Jurisprudencial nº 15, do SDC, do C.TST,
não tangencia, e por isso não afeta, a questão nuclear em discussão.(AIRR -
192340-44.2001.5.01.0046 , Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan
Pereira, Data de Julgamento: 12/05/2010, 3ª Turma, Data de Publicação:
28/05/2010).
Devem as partes percorrerem o
caminho próprio da cisão, sendo esta a vontade dos sindicalizados, a ser
constatada em assembléia. Enquanto não formalizada, não é irregular a
representação dos sindicatos pelo reclamado. Também não é possível a declaração
de inexistência do reclamado, visto que não foi formalmente constituído.
Pelo exposto, nego provimento ao
pedido.
2.2.2 DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
O Colendo Tribunal Superior do
Trabalho, por meio da Instrução Normativa nº 27, já pacificou o entendimento de
que, "exceto nas lides decorrentes da relação de emprego, os honorários
são devidos pela mera sucumbência" (art. 5º).
Desse modo, reputa-se cabível a
aplicação do princípio da sucumbência insculpido no art. 20 do CPC, não havendo
falar em incidência do art. 14 da Lei nº 5.584/1970 na hipótese vertente.
Nega-se provimento.
CONCLUSÃO
A C O R D A M os Magistrados da
1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, por unanimidade,
conhecer do recurso ordinário e, no mérito, negar-lhe provimento.
Vitória - ES, 21 de setembro de
2010.
DESEMBARGADOR JOSÉ LUIZ SERAFINI
Relator
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