domingo, 17 de abril de 2011

PONTOS DE VISTA

Desarmamento ajuda a combater a violência?

Um juiz e o secretário de Segurança Pública têm visões diferentes sobre esse tema que voltou ao debate no país


É preciso desarmar
Mais de 90% das armas usadas pelos criminosos foram tomadas de cidadãos honestos, que as adquiriram regularmente no comércio especializado. E 98% dos homicídios são praticados com armas de calibre permitido. Quase todas nacionais. A ideia de que os criminosos usam poderosas armas contrabandeadas é um mito: fuzis militares servem apenas para exibições de força entre traficantes, sendo inteiramente inadequados para uso fora da guerra convencional, quanto mais para assaltar um transeunte no meio urbano. Em resumo, as pessoas são assaltadas e assassinadas justamente pelas próprias armas que compraram na tola ilusão de que com elas poderiam se defender.
Não existe bem mais valioso para um criminoso do que uma arma de fogo. Assim, quem tem consigo uma delas é, exatamente por isso, alvo preferencial de assaltantes. Mais frequente é a notícia de que a vítima acabou morta, ou que atingiu por engano o filho que voltava tarde para casa e outras tragédias semelhantes. As estatísticas não permitem qualquer ilusão: quem tem consigo uma arma de fogo corre muito mais risco de ser vítima de violência, e de violência mais grave da que sofreria estando desarmada. De quebra, ainda compra, junto com a arma, o risco de se tornar o agressor.

Os mesmos traficantes que hoje matam de maneira tão casual estão perfeitamente conformados com o fato de que logo se tornarão vítimas. Estão habituados ao pensamento repetitivo de que o homicídio pode resolver qualquer conflito. Infelizmente, matar tornou-se algo banal para grande parte da sociedade brasileira.

Sabemos que os crimes acontecem muito mais nas áreas onde o Estado não se faz presente, mas não se trata simplesmente de pobreza. Matando e deixando-se matar, esses jovens mostram que não dão valor à vida do outro, mas tampouco à sua própria. E não inventaram isso; alguém lhes ensinou. Os poderes públicos e políticos corruptos lhes ensinaram isso abandonando completamente esses cidadãos. É preciso mostrar a esses jovens que alguém se preocupa com eles, que alguém lhes dá valor.

Tragédias como a recente da Escola Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio, não são a única razão para o desarmamento, mas são uma boa razão, e um bom momento para reflexão. É preciso desarmar a população. Os cidadãos de bem tanto quanto os cidadãos criminosos. Mais difícil e mais urgente, porém, é desarmar os espíritos. Dos policiais, inclusive.

Henrique Herkenhoff
é secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social do Espírito Santo



Por que desarmar o cordeiro?

Estarei sempre do lado da paz. Mas em razão da tragédia de Realengo querer voltar o discurso proibidor da venda e pelo recolhimento das armas já registradas. Com isso não posso concordar, pois não vejo o porquê de impedir o cidadão de bem de exercer o direito da legítima defesa. Ademais, bandido não compra arma na loja, mas no contrabando, como fez o insano no Rio.
O Estado precisa é desarmar o criminoso. Se quiserem "todos" desarmados, que reformem a Justiça, as leis, a polícia, e fiscalizem nossas fronteiras. O delinquente só terá a certeza absoluta de que não encontrará resistência no assalto, no sequestro e na invasão das residências.

A pessoa pode nunca ter uma arma, mas deve ter o direito de, ao menos, contar com o benefício da dúvida gerada nos bandidos. O porte e posse de armas já são proibidos, existindo por exceção, e não é isso que está vindo à tona com a nova proposta, mas, sim, a comercialização.

Hoje a venda já conta com uma burocracia necessária, e é caro adquirir e registrar uma arma. Mais uma lei isolada não produzirá a eficácia desejada. O desarmamento popular só pode ser imposto quando se tem uma polícia apta a garantir a segurança social. Só desarmar a população, sem garantir a sua segurança, é armar o lobo e desarmar o cordeiro.

Se valer da tragédia do Rio faz da política antiarmas totalmente inconsequente e apoiada em emocionalismo. Enquanto for mantida a impunidade reinante no país, com leis processuais frouxas, e apresentadas falsas soluções para o problema da criminalidade, como este, estaremos caminhando na direção de miragens, sedentos por um gole de segurança.

Tal discurso esconde o Estado atrás de sua incompetência em resolver tais problemas através de políticas públicas efetivas, como o tratamento de toxicômanos e doentes mentais, melhor aparelhamento do aparato policial etc. Estatística oficial do Exército brasileiro mostra que após o estatuto do desarmamento a venda de armas no país caiu, mas a violência cresceu.

Aliás, pensem: por que deputados e senadores se autoexcluíram das restrições à posse e porte de armas de fogo? Se desarmar o cidadão é tão importante assim, não deveriam suas excelências dar o bom exemplo sendo os primeiros a abrir mão desse privilégio? Isso é hipocrisia.

Vamos exigir que a polícia tenha condições de trabalho! Vamos exigir critérios rigorosos para a aquisição e uso das armas! Vamos exigir exames constantes dos candidatos à compra de armas! Mas proibir o cidadão de bem de se proteger, enquanto o Estado não consegue fazê-lo, é só discurso politicamente correto. E disso, o povo já está cheio!

Carlos Eduardo Ribeiro Lemos
é juiz de Direito

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