quinta-feira, 17 de março de 2011

REFLETINDO SOBRE A ESCALA ESPECIAL

Instituída há mais de doze anos para escamotear um aumento salarial localizado para os policiais civis e militares, a “escala especial” se transformou numa verdadeira exploração da categoria.  
Durante todos esses doze anos, os policiais perderam o direito de descansar nos finais de semana e feriados, sendo a única categoria do Serviço Público que não tem direito a essa garantia elementar de todo trabalhador. 

Os policiais passaram a “morar” nas Polícias todo final de semana, todo feriado, todo dia de descanso. E para a população isso é uma péssima política de segurança estatal, pois os policiais se tratam de uma categoria estressada e adoecida, tomando-se apenas como referência o dia a dia policial, pois as atividades que exercem são comprovadamente estafantes e as que apresentam o maior grau de desvios físicos e mentais. 
A entrada de um novo Secretário de Segurança, Desembargador Federal, trouxe uma esperança para os policiais, haja vista tratar-se de uma pessoa da mais alta cultura jurídica e, portanto, conhecedor dos meandros que levam, por meio de leis estapafúrdias, à exploração dos trabalhadores pelo Estado. 
Para participar dessa “escala de serviço extra”, a única exigência é UM REQUERIMENTO FEITO AO CHEFE DE SERVIÇO. BASTA OS POLICIAIS REQUEREREM E, INCONTINENTI, SERÁ DEFERIDA A PARTICIPAÇÃO NA “ESCALA DE SERVIÇO EXTRA”, conforme regulamentação: 
“Art. 3.º - A Gratificação de Serviço Extra, definida no art. 1.º da Lei Complementar n.º 117, de 24.04.98, será concedida ao servidor policial civil que participar VOLUNTARIAMENTE, mediante pedido formal, de escala de serviço especial de, no mínimo, seis horas.” (Decreto n.º 4.293-N) 
(...) será concedida ao servidor policial civil que participar VOLUNTARIAMENTE,(...) (ART. 3.º, DO DEC. N.º 4.293-N) 
Para que se tenha uma idéia do que representa essa “gratificação” exploratória, os policiais não pedem mais aposentadoria e não podem nem sequer adoecer, pois todos os seus compromissos salariais são realizados contando com a percepção dessa “gratificação”, que representa 1/3 (um terço) dos vencimentos líquidos dos integrantes da categoria. Se um policial, por exemplo, sofre um acidente, por mais grave que seja ele vai trabalhar de qualquer forma senão não tem condições de pagar suas contas. 
Para piorar, o Estado useiro e vezeiro em descumprir leis, já anexou a “escala especial” aos salários dos policiais, DEFINITIVAMENTE, afrontando as próprias leis que cria. Situação grave, num Estado sério! Duas perguntas ficam no ar: 1) existe esse tipo de decreto autônomo (?); 2) um decreto pode contrariar a própria lei que finge regulamentar (?). A "escala especial" poderia ter voltado por decreto? Isso por que: 
LEI COMPLEMENTAR Nº 247/2002 
O GOVERNADOR DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO 
Fixa novos valores de vencimentos para servidores policiais civis.
 Faço saber que a Assembléia Legislativa decretou e eu sanciono a seguinte Lei: 
Art. 1ºOs valores dos vencimentos dos cargos integrantes das carreiras do Quadro de Pessoal da Polícia Civil, com o novo escalonamento vertical, são os constantes dos Anexos I a V, observando-se as disposições seguintes: 
I - a partir de 1º de julho de 2002, os vencimentos são aqueles fixados no Anexo I, com a extinção 1 (uma) escala especial de serviço para todos os servidores policiais; 
II - a partir de 1º de outubro de 2002, os vencimentos são aqueles fixados no Anexo II, com a extinção mais 1 (uma) escala especial de serviços para todos os servidores policiais;
 III - a partir de 1º de janeiro de 2003, os vencimentos são aqueles fixados no Anexo III; 
IV - a partir de 1º de abril de 2003, os vencimentos são aqueles fixados no Anexo IV, com a extinção de mais 1 (uma) escala especial de serviços para todos os policiais; que continuarem a receber a Gratificação de Serviço Extra; 
V - a partir de 1º de julho de 2003, os vencimentos são aqueles fixados no Anexo V, COM A EXTINÇÃO DA ÚLTIMA ESCALA ESPECIAL DE SERVIÇO DOS SERVIDORES POLICIAIS CIVIS. 
É possível, então, que uma lei extinga a “escala especial”, EXPRESSAMENTE, e tempos depois, por meio de um DECRETO essa mesma “escala especial” retorne sem passar pela Assembléia Legislativa, onerando os cofres públicos em quantias vultosas? Isso pode ser feito por decreto? 
A Constituição Federal consagrou as horas extras quando dispôs no inciso XVI do art.7º que a “remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal” será garantida a todo trabalhador.  
Entretanto, as horas extraordinárias devem estar diretamente ligadas à extrema necessidade do serviço, não podendo comprometer toda uma vida de trabalho dos policiais e, muito menos, possuírem caráter perpétuo. Senão, os policiais passam toda sua vida laboral fazendo hora-extra. É certo? É legal? É constitucional? 
E mais: sua instituição, sua definição e seus limites devem estar estipulados no Regime Jurídico dos Servidores Públicos Estaduais, por ser matéria referente a direitos dos servidores entendidos em sua forma geral, assim definido: 
Art. 1º Esta Lei Complementar institui o Regime Jurídico Único dos servidores públicos civis da administração direta, das autarquias e das fundações públicas do Estado do Espírito Santo, de qualquer dos seus Poderes.
Parágrafo único . O Regime Jurídico Único de que trata este artigo, tem natureza de direito público e regula as condições de provimento dos cargos, os direitos e as vantagens, os deveres e as responsabilidades dos servidores públicos civis. (Lei Complementar n.º 46/94) 
E é exatamente a Lei Complementar n.º 46/94 que estipula o conceito do que seja serviço extraordinário: 
Da Gratificação por Prestação de Serviço Extraordinário 
Art. 101. O serviço extraordinário será remunerado com acréscimo de cinqüenta por cento em relação à hora normal de trabalho. 
§ 1º. Somente será permitido serviço extraordinário para atender a situações excepcionais e temporárias, respeitado o limite máximo de duas horas diárias, e não excederá cento e oitenta dias por ano. 
§ 2º. A gratificação somente será devida ao servidor público efetivo que trabalhe além da jornada normal, vedada sua incorporação à remuneração.
OBS.: Atente-se que quando este § 2.º veda sua incorporação à remuneração, está-se referindo a horas extras, e não a serviço permanente (HABITUAL), disfarçado de horas extras, realizado pelos policiais há mais de 10 (dez) anos, todos os meses, ano a ano. 
E o que pensa o STF sobre o assunto: GRATIFICAÇÃO HABITUAL (INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL): 
“Art. 201, CF
§ 11º - Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefício, nos casos e na forma da lei.” 
Não respeitam as próprias leis que criam, não respeitam a Constituição e as decisões do STF. E querem respeito por parte do trabalhador? Querem mesmo é uma ilegal e eterna subserviência. 
A “escala especial” É SALÁRIO! E sobre ela deve incidir contribuição previdenciária. Essa se trata de mais uma ilegalidade e de mais um rombo que os governos estão causando aos cofres do Estado. Por esse motivo, ela deve ser imediatamente anexada aos salários dos policiais, dando-se fim a essa exploração permanente. 
E o que são parcelas integrantes do salário, sobre as quais obrigatoriamente devem incidir contribuição previdenciária? 
PARCELAS INTEGRANTES DO SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA:
A contribuição social incidirá sobre os valores recebidos pelo segurado que tenham natureza remuneratória. 
Três espécies de verbas desta natureza integram o conceito de salário de contribuição, praticamente exaurindo o seu alcance. São elas: 
1°) o salário propriamente dito, que é o conjunto de prestações em espécie (dinheiro) fornecidas diretamente e com habitualidade pelo empregador em decorrência do contrato de trabalho. O salário é composto de uma parcela fixa, que sempre é devida ao trabalhador, e de diversas parcelas que são pagas ao trabalhador apenas quando atendidos determinados pressupostos legais, que são os abonos, os adicionais, as gratificações, as comissões, as percentagens e as diárias excedentes a 50% do salário;
(...) 
3º) os ganhos habituais, que abrangem todas as demais prestações pagas com habitualidade em função do contrato de trabalho, sejam em espécie (dinheiro) ou sob a forma de utilidades (alimentação, vestuário, moradia, entre outras).

GRATIFICAÇÕES: As gratificações, a exemplo dos abonos e dos adicionais, também consistem em valores acrescidos ao salário do trabalhador que não se confundem com a parcela remuneratória fixa estipulada. Decorrem de ajuste expresso ou tácito, este manifestado pela reiteração do pagamento. A característica essencial que tem que acompanhar o pagamento das gratificações é a sua habitualidade. Sejam ajustadas expressa ou tacitamente, em montante inferior ou superior à parcela fixa do salário, quando pagas com habitualidade têm caráter remuneratório e, portanto, sujeitam-se à incidência tributária.


A este respeito já se pronunciou oSTF, na Súmula 207: “As gratificações habituais, inclusive a de Natal, consideram-se tacitamente convencionadas, integrando o salário”. Como se nota, a Suprema Corte deixou bem clara a necessidade de observância do requisito da habitualidade para que possamos considerar as gratificações como de natureza salarial.
GANHOS HABITUAIS:

Dispõe o art. 201, § 11, da Constituição: “Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei”. 
 
Afora isso, dispõe o art. 40, § 12, da Constituição: Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.
Já passou em muito a hora de cessar a exploração dos policiais, o descumprimento acintoso das leis e da Constituição. Passou em muito a hora de cessar esse rombo mensal de milhões que o governo dá nos cofres previdenciários dos servidores, por decreto, sobre o trabalho dos policiais! 
A segurança pública pode dar certo quando o servidor incumbido de executá-la é espoliado pelo próprio Estado?! 

“ESCALA ESPECIAL” É SALÁRIO! ANEXAÇÃO JÁ!

Por Antônio Tadeu Nicoletti Pereira

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